domingo, novembro 10, 2002

Paz na solidao

Está um calor abrasador.
A cama coberta de branco ganha vida, assim que Joao
recupera os sentidos..
Desorientado e deslocado, aparenta cansaço.
- Onde estou?
- Porque me doi bem fundo cá dentro? Porque?
Senta-se na sua cama, pensativo.
Em sofrimento..
Afagando as suas feridas chora. E diz ao céu que nunca mais será puro.. Nunca Joăo sentira a sua loucura ao rubro.
- Quero estar só.
- Quero esquecer que o dia ás vezes trás alegria.
- Năo quero sequer acreditar que há pessoas lindas.
Levanta-se e fecha a janela com violencia.
A forma mais simples de se esconder do mundo é cobrir o ambiente de negro, esse vasto véu de solidăo.
Respira ofegante (gemendo a sua dor) á medida que o escuro lhe proporciona aquele prazer temporario, alivio que tras calma.
- Joăo Joăo, nunca aprendes!
- A tua transparencia e pureza só te trás angustia e desilusăo.
- Foge Joăo, foge.. para bem longe, para onde possas voltar a fugir. Porque nunca será diferente.
Monologos atrás de monologos..
Perguntas atrás de perguntas.. sem resposta.
Joăo chora.. e cobre os lençois de abandono. Aninhado, foca o brilho de uma fotografia.
Inesperadamente grita, talvez porque voltou a pensar.
E neste quarto quase vazio, de janela fechada e sonhos enfraquecidos, o fumo de um cigarro é talvez
o que de mais vivo possa ter surgido.
Tremulo, saboreia o cigarro.
Lagrimas escorrem por entre o fumo e arrepiam.. săo metaforas e adjectivos, săo as gotas
de silencio que ecoaram semana fora, vida fora..
- É a indiferença, a falta de emoçăo..
Afirma indignado.
- Sois falso se escondes ou moderas teus sentimentos!
- Quero estar só.
- Sou uma pelicula de ridiculo, fragil e acabado. Choro por dentro pois sou fraco, desvinculado da realidade. Sim,
porque essa para mim já morreu.
O telefone toca e Joăo esconde o pensamento. Arremeça violentamente a origem deste som ensurdecedor contra a parede.
- QUERO ESTAR SÓ!
E chora.. quebra e mete as măos a cabeça.
- Sofro porque quero, e é por năo querer outra coisa..
- Serei janela trancada, janela que dá para o mar.
- Serei brisa matinal, que foge do tempo.
- Tudo para me compensar, para năo mais sofrer por amar.
Joăo acordou a querer morrer e já tăo cedo quer mudar..
Cigarro atras de cigarro, memoria atras de memoria.. passado que năo quer passar.
É cedo, o silencio apodera-se do quarto e o fumo já é imenso..
A cama encontra-se deslocada da sua posiçăo inicial. Fotografias rasgadas cobrem o chăo, brilhante.
Săo memorias que queriam ser esquecidas, irascívelmente destruidas.
Joăo adormece.. e vai murmurando..
- Quero estar só.. para mais năo sofrer.
- Quero estar só..
- Só..
Caindo no sono e na ilusăo (fragil contentamento), mal sabe Joăo que nunca será assim.
A paz emocional é temporaria e cativante e nunca.. nunca será diferente.
Pobre Joăo, só encontra paz na solidăo.